Para Marinete Pinheiro, Dia da Mulher é mais que carinho, manifesto

 

Difícil é sair do lugar do comum quando se quer falar sobre estas datas. A responsa é grande. O legal de ter um blog é sair da zona de conforto. Difícil é evitar os clichês, sei lá se fui bem sucedido.

Em todo caso, gostei bastante de falar e, depois de ler o que a Marinete Pinheiro respondeu sobre o Dia da Mulher. Sete questões que trataram do (mundo) audiovisual e, algumas coisas mais. “ A mulher que representa o MS é aquela que traz na sua vontade de ser o amor por este lugar”, falou a cineasta. De quebra, ela indicou cinco filmes com elas no comando.

Atenção: se quiser, pode pular a Introdução estilo camarada e sinceridade constrangedora e ir para o que interessa.

Introdução

A dica foi do Marcelo Rezende, que sempre dá uma força. Uma hora, temos de trocar ideia novamente e registrar aqui, na farmacinha. “Tem a Marinete, ela fez uns documentários, gente boa, é coordenadora do MIS (Museu da Imagem e do Som de Campo Grande-MS)”, falou o amigo. Beleza, manda o contato. Na quarta-feira, dia 3, resolvi ligar. Deu certo. Para minha surpresa, a cineasta/escritora/jornalista, mesmo sem nos conhecermos, foi super atenciosa. Sei lá se ela reparou meu nervoso (algo recorrente quando falo com alguém pela primeira vez para entrevistar). Se sim, levou na boa.E, topou responder ao nosso esforçado blog.

Hoje, sei que ela nasceu em Aral Moreira, ali pertinho de Ponta Porã, fronteira com o Paraguai, mora na Cidade Morena desde os 4 meses e tem uma filha, a Agatha.

Sinto-me sortudo em, mais uma vez, entrevistar alguém que tem paixão pelo que faz. Muito, muito bacana!


Vamos ao que interessa

No fim, além do Dia 8, ponto de partida, a sul-mato-grossense escreveu o que pensa desde a situação do audiovisual no Brasil, e na pandemia, até conselho para quem começar nesse mundão de audiovisual.

Ah, perguntei quem melhor representaria a mulher sul-mato-grossense? Beth, Betinha, Delinha, ou Helena Meirelles? E, ainda, cinco filmes com mulheres no protagonismo que marcaram Marinete.

Dá um confere.

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Drugstore Kishô – Para você, o 8 de março representa simbolicamente o quê necessariamente? 

Marinete Pinheiro - Para mim é sempre rememorar, reforçar e dar continuidade às lutas das mulheres por mais justiça social, igualdade, reconhecimento e equidade. Precisamos lembrar que a data nasce de um processo revolucionário de luta e por isso mais que carinho, afeto, flores, precisamos que entendam esse dia como um manifesto.

DK – Hoje, a situação da mulher no cinema e na música, especificamente, é parecida no Brasil, em Cuba, nos EUA, e na Europa?

Marinete - Estamos cada vez mais conquistando espaço, desbravando mercados e janelas antes dominadas por homens, isso nos mais diversos setores, na política por exemplo, e o caminho está na construção de uma consciência coletiva que deve ter como base o acesso à educação.

Em termos de continente, ou países, na minha opinião, não se pode comparar, cada lugar tem uma cultura e uma economia que influência diretamente nestes setores. No Brasil estávamos com uma indústria audiovisual pulsante até 2018 e depois vimos uma queda vertiginosa, não só no cinema, mas em todos os setores da cultura, um prejuízo e um retrocesso que vamos carregar por décadas ainda, e essa carga é bem pesada, a ignorância é um mal da humanidade.

DK - Desde quando você se enveredou por esta carreira audiovisual, houve uma linearidade quanto ao espaço que as mulheres avançaram nesta área? Ou ela melhora ou piora a depender da época? 

Marinete - Eu comecei no cinema na verdade pela Literatura, quando publiquei em 2008 o livro “Salas de Sonhos - História dos cinema de Campo Grande” que foi meu TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) no curso de Jornalismo, depois fui selecionada para estudar cinema na Escuela Internacional de Cine y Televisión de San Antônio de los Baños, em Cuba, reconhecida como a quarta melhor escola de cinema do mundo, e lá me formei em Direção de Documentário, e hoje como poucas pessoas neste estado, vivo exclusiva do cinema/audiovisual. Neste caminho publiquei em 2010 o meu segundo livro “Salas de Sonhos- Memória dos Cinemas de Mato Grosso do Sul” em 2010.

Sobre o cenário, melhora, por exemplo, existem hoje organizações de mulheres diretora de fotografia, função que sempre foi dominada por homens, pela questão física mesma, antes era difícil mulheres em departamentos como este e outros como elétrica e maquinaria. Para mim a tendência é melhorar e ampliar, porque as mulheres estão batendo o pé na porta e tomando postos, ainda que, o machismo que é estrutural permaneça.



DK - Para você, quem melhor representaria a mulher sul-mato-grossense? Beth, Betinha, Delinha, ou Helena Meirelles? Outro nome também vale. E, por quê?

Marinete - Todas elas nas suas especificidades representam, e isso é magico. São cantoras/artistas de uma música genuinamente sul-mato-grossense. Poderia sim incluir várias, mas o exercício de listar é perigoso, às vezes a memória falha deixa alguém de fora. A mulher que representa o MS é aquela que traz na sua vontade de ser o amor por este lugar.

DK – Em entrevista a este blog, o muralista Eduardo Kobra (depois, se quiser ver, o link está lá no fim) afirmou que, “com a globalização, não é necessário você ir para Nova Iorque para ser reconhecido. Você pode pintar no bairro que você nasceu, começar de uma forma mais simples, sabe?! Mas com muita seriedade, assim como em qualquer profissão. Um dia o reconhecimento aparece.” Você concorda? Dá para ter visibilidade sem ter de se mudar para os grandes centros? 

Marinete - Um professor meu na escola internacional de cinema em Cuba, dizia que “para falar e pensar o mundo é preciso primeiro pensar e falar a nossa aldeia, nossa rua, ou nosso lugar” e eu tenho isso para minha vida. As coisas mais interessantes, e que as vezes são universais, estão aqui, ao nosso lado, dentro de casa, e o reconhecimento se dá para mim pela gratidão daquilo que fazemos independente do lugar.

Sigo aqui em Campo Grande por acreditar na minha contribuição a essa sociedade, por saber do poder transformador que o cinema tem na vida das pessoas e, como tive o privilégio de estudar em uma escola com pensamento socialista, criada para democratizar o acesso a formação cinematográfica e fortalecer o cinema periférico, em especial o latino-americano, africano e asiático, sigo na minha missão de fazer e ensinar cinema. Não podemos passar por essa existência sem acreditar naquilo que vivemos, e mais, sem acreditar na nossa importância para o outro, empatia, responsabilidade, amor aquilo que faço, me move!


DK – Praticamente um ano de pandemia, o audiovisual brasileiro sofreu muito? Para a mulher, mais ou igual? Você conseguiu ou está em produção de algum trabalho em vídeo, ou cinema?

Marinete - Todos tiveram que se reinventar e no âmbito do audiovisual houve uma crescente devido a demanda de produtos para as pessoas que precisavam ficar em casa. Eu particularmente estive envolvida em vários processos, como por exemplo muitas lives e aulas de cinema e audiovisual. Como obra dirigi junto com Filipi Silveira o curta metragem “Ano que vem tem mais” que conta a história do carnaval de Campo Grande (documentário 32 min./2020)

DK – Aproveito o ensejo para emendar a clássica: Qual o conselho que você dá para aquela garota que mora em Campo Grande e sonha em fazer carreira atrás de uma câmera?

Marinete - Conte suas histórias, as pessoais, e estude muito, estude tudo sobre cinema, para qualquer área de atuação é importante conhecer todos os processos, por exemplo, quem faz fotografia precisa saber de som e edição, mesmo que minimamente mas precisa, e quem vai dirigir precisa saber muito de todos os processos.


Marinete indica

Este que escreve pediu umas dicas de filmes, Marinete topou, e um tempinho depois para escolher... “Os filmes que listei tem relação com as mulheres e realmente me marcaram muito, em todos, elas são as protagonistas.”

1. Sonata de Outono - Direção Ingmar Bergman (1978)



2. As sufragistas - Direção Sarah Gavron (2015)



3. Maria en Tierra de Nadie - Direção Marcela Zamorra (2011)



4. Vazante - Direção Daniela Thomaz (2017)



5. Violeta foi para o céu - Direção Andrés Wood (2011)



Fico meio com vergonha de dizer isso, mas não vi nenhum. Porém, tá tudo anotado. Obrigado pelas dicas, Marinete.

Links de algumas coisas citadas nesta receita:

- Documentários sobre Delinha e dupla Beth e Betinha são exibidos nesta quarta no Autocine – Do Correio do Estado https://url.gratis/xCry7

- Qual a origem do Dia Internacional da Mulher? Ele foi criado em 1910 por Clara Zetkin, uma professora e jornalista alemã que se tornou um dos ícones do feminismo - Superinteressante https://url.gratis/qxbGh

- Eduardo Kobra falou ao Drugstore Kishô: Mil faces de um homem mural - https://url.gratis/1oOU3


Dicas para (não) desopilar

- Bunny Wailer (of The Wailers) Tribute Video – Singela homenagem a Bunny Wailer, que fundou The Wailers com Bob Marley e Peter Tosh, morreu aos 73 anos na terça-feira (dia de perdas gigantes, aliás). Conhecia pouco dele e admito que sei muito mais da dupla Marley e Tosh. Mas, fica a lembrança.



- Para variar Rubens Valente dá outra aula de jornalismo nessa live da Abraji, com Marcelo Beraba. Sobretudo nesses dias, em que o “é tudo culpa da imprensa” beira o irracional. 

“Temos de devolver as bananas que ele manda com jornalismo, não rebatendo o histerismo”, falou mais ou menos assim, Rubens, que sempre impressiona pela simplicidade sempre desproporcional ao que ele representa na reportagem nacional.



É isso, já deu, encerro por aqui enquanto escuto o álbum Flor de Guavira, da Dama da Viola, no Spotify. Espero que tenham gostado.

Qualquer coisa, curte, compartilhe, diga o que achou. E, se quiser apoiar de alguma forma o Drugstore Kishô, agradeço.

Também estou no twitter (@KishoShakihama), linkedin e afins.

Abraço, se cuide, e, por favor, máscara.


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